Nota: para não interromper sua leitura, as referências encontram-se ao final do texto.

Ontem foi a apresentação de Dia das Mães da minha filha na escola. Era a primeira vez que eu participava de uma ocasião assim como mãe, e confesso: me senti muito mãe, daquelas que tiram foto com as flores que receberam, risos.

Antes da apresentação, a diretora da escola falou algumas palavras que me fizeram refletir. Sua fala tinha muito a ver com os temas que compartilho aqui no blog sobre redes sociais. Ela falou sobre o excesso de expectativas, a pressão silenciosa e a comparação constante que a maternidade digital impõe.

Ela disse que hoje há uma cobrança muito maior sobre nós, mães, do que havia no passado. E essa cobrança é potencializada pelas redes sociais (comparação X julgamento X obstinação à perfeição).

Vivemos cercadas de imagens de mães aparentemente perfeitas: corpos impecáveis no pós-parto, filhos que comem vegetais sorrindo, casas sempre organizadas, rotinas impecáveis e uma paciência infinita. A verdade é que esses recortes são cuidadosamente editados. São performances para engajar online.

Ao contrário de nossas mães e avós, que se comparavam apenas com as vizinhas ou com as mães da escola, hoje temos milhares de mães para nos comparar e, muitas vezes, sem contexto necessário para avaliar situações com um olhar mais neutro.

No livro A Geração Ansiosa, o psicólogo Jon Haidt destaca que mulheres, desde muito jovens, tendem a se cobrar mais e a se comparar com maior frequência. Essa característica, somada ao ambiente digital, forma uma tempestade perfeita para a nossa saúde mental.

No meu caso, a maternidade foi o grande gatilho que me fez repensar o uso das redes sociais. Comecei a perceber o quanto aquilo estava me fazendo mal: o cansaço, a autocrítica constante, a sensação de inadequação. Me incomodava especialmente ver profissionais de saúde criando conteúdo com tons de alerta e pressão, vendendo cursos disfarçados de empatia, mas que muitas vezes só geravam ansiedade nas mães.

Pode ser cruel ver que o filho da influenciadora “X” já fala inglês com dois anos enquanto o seu está tentando dizer “mamãe”. É exaustivo ver mães dizendo que seus filhos comem quinoa e pedem música na Alexa, enquanto você está lutando para fazer o seu comer arroz e feijão.

Eu não queria sentir isso. E também não queria ser gatilho para outras mães. Decidi que, ao invés rolar feed e de registrar tudo para postar, eu iria viver mais com os olhos e menos com o celular. Ser mãe já é um desafio enorme, não precisamos adicionar mais peso com comparações irreais e perda de tempo com conteúdo que não agrega.

Além disso, precisamos refletir sobre a exposição dos nossos filhos nas redes sociais, uma escolha que, na maioria das vezes, é feita por nós, sem que eles tenham qualquer poder de decisão ou compreensão dos riscos envolvidos. O que hoje parece apenas uma lembrança fofa pode se tornar algo extremamente constrangedor no futuro, quando eles tiverem mais consciência de si e da sua privacidade.

Com o avanço da inteligência artificial e a possibilidade de criação de deepfakes, esse tipo de exposição se torna ainda mais perigoso.

Mesmo em perfis privados, não sabemos quem realmente está do outro lado da tela, tampouco quais são suas intenções. Essa vulnerabilidade digital pode, inclusive, abrir brechas para situações de importunação e outros riscos emocionais e físicos. É nossa responsabilidade protegê-los também no ambiente virtual.

Ser mãe no século XXI é fazer escolhas conscientes. É saber filtrar o excesso de informação. É entender que há uma diferença entre educar com intenção e se tornar refém de uma perfeição impossível. Estamos dando o nosso melhor, mesmo que às vezes isso signifique repetir padrões familiares ou, ao contrário, quebrá-los com coragem.

É importante lembrar que o barulho nas redes quase sempre vem dos extremos: opiniões radicais, certezas absolutas, julgamentos rápidos. E quando estamos mergulhadas nos hormônios do começo da maternidade e sofrendo com a privação de sono, ficamos ainda mais vulneráveis a tudo isso.

A verdade é que não precisamos das redes sociais para validar nossa maternidade. Não precisamos estar o tempo todo olhando para telas, enquanto nossos filhos estão ali do lado querendo mostrar uma dancinha da escola, o desenho que fizeram ou só pedindo a nossa atenção.

Quanto mais tempo passamos na tela, mais normalizamos esse comportamento para nossos filhos. Eles aprendem conosco, e o que mostramos importa muito mais do que o que falamos.

Quando você percebe que o tempo gasto nas redes sociais pode ser convertido em um jantar feito juntos com calma, uma leitura antes de dormir ou uma brincadeira no chão da sala, tudo começa a mudar. A rede social perde a importância.

Permita-se viver momentos sem registrar. Libere-se da necessidade de filmar, fotografar e postar cada passo. Isso é uma prisão disfarçada de liberdade.

Experimente sair de casa sem celular. Ou compre uma câmera antiga só pela diversão, talvez você nunca reveja as fotos, mas não vai esquecer da interação que ela gerou em um momento fora de casa.

Guarde mais coisas na memória do que no HD. A memória emocional é o que molda os vínculos. Que a nossa presença seja mais forte que qualquer algoritmo ou tentação para receber um pouco de dopamina das redes.

Ser mãe no século XXI é difícil, sim. Mas também é uma oportunidade de fazer diferente. E fazer diferente não é ser perfeita, mas sim ser intencional e consciente.

Referências

Infância entre telas e brincadeiras esquecidas

Como a minoria vocal molda sua percepção de realidade

Estratégias usadas para manter você engajado (e consumindo)

Haidt, Jonathan. The Anxious Generation: How the Great Rewiring of Childhood Is Causing an Epidemic of Mental Illness. 2024.


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3 respostas para “Ser mãe no século XXI e a pressão silenciosa das redes sociais”.

  1. […] dica é evitar ao máximo se comparar, por isso, se afastar das redes sociais é importante. Cada família é única, e equilibrar a […]

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  2. […] Foi um dos motivos que me afastaram das redes sociais. Mesmo conteúdos “bons” me deixavam cansada, ansiosa e menos presente. Sobretudo ao ver comentários de outras mães relatando estresse constante, isso só aumentava minha própria pressão interna. […]

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  3. […] Não se compare com outras mães, mas sim com você mesma na sua versão anterior e atual. […]

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