Nos últimos anos, os consultórios de psicólogos e psiquiatras têm recebido cada vez mais pessoas que chegam com um “autodiagnóstico” feito a partir de vídeos e conteúdos genéricos das redes sociais, em especial do TikTok e do Instagram.
Essa busca por respostas é compreensível.
Afinal, quando sentimos dificuldades emocionais, cognitivas ou comportamentais, é natural querer entender o que está acontecendo. Procurar sentido para o que sentimos faz parte do processo humano de autoconhecimento.
Mas o problema começa quando alguém se rotula sem avaliação profissional.
Além de impreciso, o autodiagnóstico pode reforçar preconceitos e estigmas sobre determinadas condições, o que dificulta ainda mais o tratamento adequado.
Sintomas podem se sobrepor e confundir
Um dos grandes riscos do autodiagnóstico, ou um diagnóstico superficial, é que muitos transtornos compartilham sintomas semelhantes.
- Pessoas com TDAH podem ter dificuldade de manter o foco em tarefas que não despertam interesse.
- Indivíduos no espectro autista podem apresentar misofonia (aversão a certos sons).
- Já a depressão pode causar fadiga constante e falta de motivação.
Porém, todos esses sinais também podem indicar transtorno bipolar, como mostra a psiquiatra Dra. Doris Moreno, pesquisadora da USP, em um dos vídeos de divulgação científica sobre o tema.
Quando os sintomas são avaliados de forma isolada, a chance de erro é enorme. E, no caso de uma medicação errada, as consequências podem ser sérias, piorando muito a qualidade de vida do paciente.
O diagnóstico psiquiátrico é um dos maiores desafios da medicina.
Por isso, a pesquisa é fundamental. A USP tem se destacado nesse campo, especialmente com o trabalho da Dra. Doris Moreno, que lidera estudos sobre o transtorno bipolar e suas manifestações clínicas.
O que diferencia pesquisadores como ela dos criadores de conteúdo sensacionalistas é justamente o compromisso com o método científico e com a profundidade.
A ciência não busca respostas rápidas, busca compreensão real. E compreender leva tempo, exige estudo, paciência e disposição para lidar com a complexidade da mente humana.
Receber um diagnóstico nem sempre traz alívio, às vezes é indigesto e desafiador.
Afinal, não se trata apenas de tomar uma medicação e esperar que tudo se resolva, mas de adotar uma nova forma de viver e se conhecer profundamente, para fazer escolhas mais conscientes e menos “emocionais”.
Em todos os casos, rotina é remédio, bom sono é remédio, atividade física também é remédio.
Diagnosticar é compreender a história inteira
Por isso, o diagnóstico deve ser sempre feito por um profissional qualificado e ético, que vai analisar não apenas os sintomas, mas também o contexto de vida, o histórico familiar, o ambiente emocional e o comportamento geral da pessoa.
Trata-se de um processo complexo, que exige escuta atenta e conhecimento técnico, e não pode ser substituído por vídeos de 30 segundos.
Ser honesto ao relatar o que acontece no dia a dia, aceitar a condição com mente aberta e sem preconceito, e buscar fontes confiáveis (como artigos científicos ou vídeos de pesquisadores indicados pelo próprio especialista) são atitudes fundamentais.
Nem sempre as melhores fontes de informação são as que têm mais likes no Instagram.
Consultar um profissional qualificado é a forma mais segura, e madura, de cuidar da saúde mental.
Compreender é também saber lidar
Recentemente, ao ler o livro Princípios, de Ray Dalio, um trecho me fez refletir sobre a importância de conhecer como o cérebro humano funciona: ele relata a experiência com o filho, diagnosticado com transtorno bipolar, foram três anos de luta para compreender a condição e aprender a lidar com ela.
A partir dessa vivência, Dalio percebeu a necessidade de estudar neuropsicologia para entender melhor o funcionamento da mente e, assim, conviver de forma mais saudável com o filho, e com as pessoas em geral.
Ele entendeu que compreender como a mente humana funciona nos ajuda a ajustar expectativas e a lidar com as diferenças com mais empatia.
Quando reconhecemos as limitações, os ritmos e as formas de pensar de cada pessoa, também diminuímos as chances de nos decepcionarmos ou reagirmos com impaciência. Aprendi isso também com o livro O Cérebro da Criança.
Com o apoio de profissionais e pesquisadores das áreas de psicologia e psiquiatria, Dalio levou esse aprendizado para dentro de sua empresa. Juntos, desenvolveram mecanismos de avaliação comportamental para entender as tendências naturais dos colaboradores e alinhar melhor suas funções às habilidades individuais.
Esse processo também passou a orientar novas contratações, tornando o ambiente de trabalho mais coerente com os perfis humanos que o compõem.
Nesse caso, não se trata de transtornos mentais, mas de tendências comportamentais, e ainda assim, foi necessária uma pesquisa profunda e acompanhamento profissional, resultando em um sistema sério de avaliação de personalidade.
Você pode conhecer esse trabalho e até realizar sua própria avaliação no site PrinciplesYou.
Antes de nos rotularmos (ou rotularmos os outros), é importante lembrar que cada ser humano é um conjunto único de experiências, emoções e contextos. Nenhum vídeo curto é capaz de capturar essa complexidade, e nenhum “rótulo” é determinante na vida. Estamos aqui para aprender e evoluir, apesar das nossas limitações.


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